Indústrias preveem demissões em Mogi das Cruzes
quarta-feira, 10 de agosto de 2011Responsável por 20% do Produto Interno Bruto (PIB) e segundo maior empregador brasileiro (o primeiro é a prestação de serviços), o setor industrial já aponta para demissões, a curto e médio prazo, em decorrência da mais nova crise econômica gerada pela quebra de confiança com os Estados Unidos, o maior mercado mundial. Esse risco só será afastado, acredita a direção regional do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp), diante de uma mudança na política cambial brasileira. Caso contrário, o processo de desindustrialização já em curso tende a se agravar e o parque industrial do Alto Tietê – formado por 1.800 empresas e cerca de 75 mil trabalhadores – poderá ser seriamente afetado. No comércio, os reflexos ainda não foram sentidos, mas os empresários do setor também estão temerosos e consideram que a queda nas vendas é quase inevitável.
O diretor do Ciesp Alto Tietê, Milton Sobrosa Cordeiro, disse que diferentemente de 2008, quando o que se viu foi uma bolha financeira dos bancos, a atual crise é gerada pela desconfiança de que os Estados Unidos poderão não pagar seus compromissos. Essa quebra de confiança, no entanto, acontece num momento em que a indústria brasileira já está com a sua competitividade comprometida pelo câmbio, que tem gerado o acréscimo das importações numa velocidade muito acima das exportações.
“Com o câmbio favorável e a queda mundial de produção, a indústria passou a ver o Brasil como um excelente mercado. Por isso, se não for mexido rapidamente na política cambial, a tendência é de que mais importados entrem no mercado brasileiro e a situação vai se agravar muito. Se não for mexido no câmbio, a indústria terá problemas sérios e a empregabilidade será comprometida”, afirma Sobrosa.
Para Miguel Torres, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo e guia da cidade Mogi das Cruzes, categoria que responde pelo maior número de trabalhadores da indústria local – cerca de 12 mil só na Região de Mogi -, não há motivos para os patrões brasileiros pensarem em corte de salários ou demissões. Pelo contrário, ele defende que os trabalhadores fiquem junto aos empresários para combater a desindustrialização e o aumento desenfreado de impostos investindo, consequentemente, no mercado interno.
“Se a indústria insistir em demissão, nós vamos enfrentar”, avisa o sindicalista.
Na opinião do representante dos metalúrgicos, o cenário global atual é um reflexo da crise de 2008 e, por isso mesmo, o Brasil tem capacidade de passar ileso. “Só saímos da crise de 2008 porque o governo manteve o aumento real dos salários do trabalhador e o reajuste do salário mínimo, incentivando o consumo interno. O Mantega (ministro da Fazenda) parece que não está aprendendo com a história e age como patrão que, numa crise, manda embora ou corta salário. Se o Brasil fizer isso, vamos ficar pior do que eles (Estados Unidos e países europeus). O que é preciso é o consumidor comprar porque daí ele movimenta o comércio, que demanda a indústria, que gera emprego”, ressalta Torres.
Professor de Gestão de Políticas Públicas da Universidade de São Paulo (USP), o suzanense Eduardo Caldas também acredita que a melhor maneira do Brasil remar contra a maré e não ser tão afetado pela atual crise é repetir a estratégia de 2008: reduzir a taxa de juros, desvalorizar o câmbio, substituir as importações e estimular o consumo interno, aproveitando principalmente o aumento da classe média brasileira e a possibilidade de consumo em massa.
Segundo Caldas, essa estratégia surtiu resultado positivo em 2008, durante a outra crise econômica mundial, e é a melhor alternativa para o Brasil, que tem pouca representatividade no cenário internacional. “O fluxo de comércio internacional brasileiro não chega a 0,2%. É muito baixo e a principal pauta de exportação são os commodities. Enquanto o Brasil tiver água e pedra, nada muda. Para o restante, não vejo nenhuma estratégia desenvolvimentista do governo, portanto, o maior mercado está no Brasil mesmo”, avalia.
Ele pondera, no entanto, que as recentes declarações da presidente Dilma Rousseff (PT) e do ministro da Fazenda, Guido Mantega, indicam que apesar do Brasil ter agido sempre com a estratégia acima, o atual governo adotará uma atitude antagônica, com uma política de juros altos para reduzir o consumo. “Diferente do que eu gostaria, a presidente quer colocar um freio no consumo o que é uma postura contrária à trajetória dela, de um olhar mais desenvolvimentista”, opina o professor, ao colocar que, pelo capitalismo, acredita que a política econômica é anticíclica, ou seja, vive de ciclos de expansão, desaquecimento e de depressão. “Tivemos um ciclo de expansão, depois de desaquecimento e agora estamos na depressão, com redução do consumo, do crescimento e do PIB. Como o Brasil vai passar por essa nova crise dependerá do caminho que o governo vai adotar. Incentivar o consumo interno ou, diferente do que eu gostaria, reduzir o consumo”, completa.
A presidente interina da Associação Comercial de Mogi das Cruzes (ACMC), Tânia Fukusen, pondera que o comércio é o último setor da cadeia produtiva a sentir os reflexos de uma crise, mas ela adianta que a preocupação existe e já começou a demandar, inclusive, a realização de palestras e cursos com especialistas para orientar os empresários mogianos sobre os grandes investimentos, assim como os de longo prazo. “Estamos com o pé atrás. Por enquanto, estamos com boas perspectivas de vendas para o Dia dos Pais, mas tudo indica que o consumo sofrerá uma retração e isso vai depender muito do impacto nas indústrias, em especial, das multinacionais”, diz.
A atual crise econômica mundial eclodiu na última semana, depois que a nota de crédito dos Estados Unidos foi rebaixada – o chamado rating – mas a situação já era preocupante em razão do nível do montante das dívidas da União Européia. O cenário global é de risco de uma onda de defaults, guerra cambial e acirramento do protecionismo comercial. Porém, ao contrário de 2008, quando houve quebra de bancos e congelamento de créditos, especialistas brasileiros acreditam que a crise atual é bem menor e se resume principalmente ao medo de uma recessão mundial.
Fonte: O Diário